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A ROTA DO CRIME

Um dos maiores assaltos a banco com ampla repercussão nacional completa um ano.

O dia 24 de abril de 2019 não sairá tão fácil da memoria de quem presenciou e viveu momentos de tensão, que envolveram toda a comunidade de Porto Xavier, Porto Lucena, Campinas da Missões e, principalmente, da zona rural da localidade denominada Linha 1º de Março.

A caçada aos criminosos durou vários dias culminando com o triste homicídio do Policial Militar, Soldado Fabiano Heck Lunkes de 34 anos.

Nossa equipe de reportagem foi ao local do assalto e percorreu o caminho dos criminosos, entrevistamos moradores, comerciantes e autoridades policiais.

O ASSALTO

No dia 24 de abril de 2019 ocorreu um assalto à agência do Banco do Brasil do município de Porto Xavier, Noroeste do Estado, quando os criminosos já chegaram atirando contra os vidros da agência bancária e obrigaram moradores a formar um cordão de escudo humano, enquanto outros seguiram em direção ao cofre e aos caixas.

Policiais Civis ouviram os disparos e foram até o local. Quando chegaram, foram recebidos a tiros. Os assaltantes fugiram em dois veículos levando três reféns, que foram liberados na saída da cidade. Ninguém ficou ferido. Iniciaram-se as buscas e a perseguição aos criminosos.

Os assaltantes conseguiram fugir para um matagal no interior de Porto Lucena. Por volta de 3h30min, o grupo teria tentado sair da mata e encontrou o cerco policial. Os bandidos portavam fuzis e atiraram contra os PMs. O soldado da Brigada Militar Fabiano Heck Lunkes, 34 anos, foi atingido por um disparo na região do tórax e morreu durante atendimento médico.

O cerco policial durou 10 dias e terminou com a morte de dois assaltantes, três presos e cerca de seis pessoas indiciadas por partícipes do crime.

PRIMEIRO ENFRENTAMENTO

Delegado Heleno dos Santos

“Trabalho em diversas delegacias da região prestando serviços, nesse dia do assalto eu iria para a Delegacia de São Luiz Gonzaga, mas acabei indo a Porto Xavier e por volta das 13h 30min estava despachando ocorrências e coordenando trabalhos no local, quando escutei sons de disparos, conseguimos diferenciar o sons de pistola, revolver e fuzil, me pareceu um som bem alto de uma arma de caça, em seguida os disparos continuaram fui até a janela, não havia movimentação estranha a delegacia fica a três quadras do banco, logo em seguida alguém gritou: estão roubando o banco! Em questão de segundos eu e a equipe das policiais, vestimos coletes, pegamos armas que haviam e fomos em uma camionete, mas sem saber direito o que estava ocorrendo. Fomos no instinto, na ideia de dar o primeiro combate. Quando chegamos próximo, conseguimos avistar os assaltante formando o cordão humano. Nesse tipo de roubo, geralmente pelo o que víamos até então, é formado o cordão humano para poderem evitar a aproximação da policia e assaltarem com mais tranquilidade, normalmente a policia fica bem distante e o que fizemos foi diferente, fomos até o local e fomos recebidos a tiros, um dos disparos atingiu o pneu da viatura, então estacionamos do jeito que deu, eu e uma policial fomos avançando taticamente o mais perto possível e a todo momento haviam disparos de fuzil contra nós. Fiquei abrigado atrás de um veículo que estava estacionado em via pública e uma policial chegou em seguida, as outras duas policiais ficaram atrás da viatura, no primeiro momento avistei quatro homens armados e depois fomos ver que um deles usava uma calibre 12 automática importada, também um modelo de fuzil modelo M4, calibre 556, de alto impacto, com um poder destrutivo bem grande. A todo momento estavam atirando em nossa direção, nós estávamos armados de submetralhadoras e acabamos efetuando alguns disparos por cima, para tentar intimidar e depois constatamos que surtiu efeito moral a nosso favor, pois os criminosos acabaram se atrapalhando bastante, esquecendo partes do plano que eles tinham para fuga, deixaram um veículo Argentino no local com a gasolina, a ideia era fugir por uma estrada vicinal colocando fogo no carro da fuga para prejudicar a coleta de provas. O nosso confronto com disparos acabou fazendo com que eles desistissem de assaltar outros bancos, que após a investigação, descobrimos que a ideia era assaltar mais um banco próximo. Também acabaram se atrapalhando na hora da fuga, saindo um para cada lado, erraram as ruas”.

“Foram minutos de pânico”, diz empresária

Rosalete Kohlhammacher

Conversamos com a empresária Rosalete Kohlhammacher, proprietária uma loja em frente ao Banco que foi alvo dos criminosos. Ela nos relatou os momentos de pânico que foram vividos durante os minutos que pareciam intermináveis, “Nunca passei por nada parecido, foram minutos de pânico, cena de filme, quando achávamos que estava acabando, eles descarregavam as armas dando tiro, foi muito tiro, assustador”.

“A loja tem a fachada de vidro, desta forma, foi fácil ver que se tratava de um assalto, alguns moradores demoraram a perceber, somente quando começou os disparos”, relatou a empresária.

“Estávamos na parte da frente da loja, um dia bem calmo, quando um carro chegou muito rápido e parou do outro lado da rua, assim que desceram do veículo percebemos o assalto e tentei levar todos que estavam dentro da loja para os fundos, onde ficamos escondidos, nesse momento começou o tiroteio, os bandidos começaram a atirar para cima, pouco depois notamos que vinham disparos da rua de baixo que eram os policiais”.

DE CARA COM O ASSALTANTE

“Levamos o pessoal para os fundos, então vim ver se tinha alguém na parte da frente e dei de cara com um assaltante, ele me chamou para fora, sinalizei com a cabeça que não iria, ele me apontou a arma eu paralisei logo em seguida ele baixou a arma e seguiu com outro refém, andava com um senhor de arrasto na rua, fui para os fundos da loja com as demais pessoas e não sai mais, inclusive à loja ficou aberta”.

PERSEGUIÇÃO

“O confronto em frente ao banco com os policiais civis durou entre 15 e 20 minutos até iniciar a perseguição onde os assaltantes fugiram levando três reféns. Nossa viatura foi atingida por disparos, pegamos outra viatura discreta que chegou logo em seguida em frente ao banco, fomos entre três policiais civis na perseguição que começou pela área central e a todo momento eles efetuando disparos contra nós. Um policial militar estava em uma equina, ele entrou no carro e nos acompanhou. Saindo da cidade existe uma ponte velha onde eles abandonaram um Fiat Pálio de cor preta que era roubado e embarcaram em um veículo Sandero, que também era roubado. Embarcaram entre cinco criminosos e liberaram os reféns. A perseguição continuou por cerca de 30 km até a localidade de 1º de Março. Nesse trajeto eles conseguiram abrir uma distância e em alguns momentos perdemos eles de vista. Quando chegaram na localidade deram de frente com uma viatura da Brigada Militar e ocorreu um confronto. Eles atingiram a viatura, nesse local abandonaram o veículo e entraram na mata onde ocorreu o cerco que durou dez dias. A área de busca foi estendida por mais alguns dias”, relembra o Delegado Heleno.

CONFRONTO COM A BM

Major Valtair Dorneles

“Assim que tomamos conhecimento do assalto deslocamos a Força Tática o Grupo de Inteligência para que todas as medidas possíveis fossem adotadas para prisão dos autores. Na Linha 1º de Março, ocorreu o primeiro confronto com nossa equipe, onde então eles fugiram com o veículo Sandero para dentro da mata. Usando os equipamentos eletrônicos (drone) e efetivo que estava no local começamos a montar o cerco para fechar o local onde os bandidos estavam com a chegada de reforço e equipe do BOPE, o cerco foi aumentando e estabelecemos um perímetro, no segundo dia refeceremos o reforço de helicóptero que auxiliou na parte do cerco”, relata Major Valtair Dorneles.

Soldado Fabiano

Soldado Fabiano Henk Lunkes

O Soldado Fabiano Henk Lunkes, 34 anos foi morto pelos criminosos na primeira noite do cerco em confronto com dois dos bandidos. O soldado estava há 10 anos na Brigada Militar pertencia ao 7º Regimento de Polícia Montada de Cerro Largo, ele deixou esposa e um filho de 4 anos.
“O fato que lamentamos profundamente foi à morte do Soldado Fabiano Lunkes, na madrugada do primeiro dia de cerco, foi muito traumático para toda família policia”, diz Major Valtair.

Em reportagem do ZH a palavra coragem foi uma das características mais citadas pelos amigos ao falar do soldado Fabiano Heck Lunkes. “Ele sempre foi uma pessoa muito corajosa, antes mesmo de entrar na BM. Desde pequeno tinha essa virtude. Era uma pessoa muito bem-quista pela sociedade, todo mundo queria ele muito bem, porque ele deixava transparecer isso. As pessoas precisam saber que ele era um cara que batalhou, colocou a vida dele em troca de salvar muitas pessoas. Que as virtudes dele e coragem não sejam em vão”, conta Henrique, 32 anos, amigo de infância do soldado.

CERCO POLICIAL

Assim que os assaltantes entraram na mata começou o cerco policial que mobilizou todas as forças de seguranças. Com reforço de policiais de todo estado e uso de equipamentos como: drone, binóculo de visão noturna, helicópteros e apoio da comunidade regional, o caso teve repercussão em todo país.

“Logo em seguida ao confronto que eles tiveram com a Brigada Militar, nós chegamos. Então não sai de lá por dez dias, eventualmente para tomar banho, trocar de roupa, mas moramos no local durante todo esse tempo. Na primeira noite, durante a madrugada do dia 25/04/2019 por volta das 3h40, ocorreu um confronto. Eu estava a aproximadamente 200 metros e escutei os disparos, depois fiquei sabendo que vitimou o soldado Fabiano Lunkes, com um disparo de fuzil. Nesse confronto os criminosos largaram um saco com dinheiro e uma pistola e fugiram para o mato. No outro dia a Brigada Militar achou o fuzil que matou o policial. O cerco na área de 26 hectares contou com mais de 150 policiais civis e militares durante todos os dias. Acabamos residindo em um local precário, sem banheiro e energia elétrica. Com o passar do tempo fomos adquirindo e instalando barracas emprestadas pelo Exercito, era muito barro no local”, diz Delegado Heleno.

Major Valtair, relatou, “foram dez dias de cerco em uma área muito grande, mata serrada, chuva, lavoura, barro e frio, trabalho desgastante em torno de 2,5 Km de área de mata, muito difícil ter o domínio total e aconteceram duas fugas. Eram 150 policiais trabalhando diariamente uma logística muito grande, integração muito importante entre Brigada Militar e Policia Civil desde o início da ocorrência até o desfecho, cada um dentro de sua missão isso foi fundamental para mantar o ânimo de quem estava trabalhando e ter o êxito na prisão dos criminosos.”

“Escutávamos os gritos vindo lá de baixo”, diz moradora sobre morte de bandido

Márcia Bach

Nossa reportagem após rodar muitos quilômetros pelo interior, chegou até uma velha escola na localidade 1º de Março, encontramos um casal morando no local que serviu de acampamento aos policiais civis e militares, onde foi montado o cerco aos bandidos.

Conversamos com a agricultora Márcia Bach, moradora do local, nos relatou que estava com o rádio ligado e acompanhou toda a ação dos criminosos que foram narradas pelo repórter Jota Flores, nesse tempo estavam sendo divulgadas as localidades que o carro dos bandidos estava passando, então começaram a ficar apreensivos, pois os criminosos estavam perto, mas nunca imaginaram que em frente a sua moradia iria ocorrer o primeiro confronto com a Brigada Militar e começar toda a operação de cerco aos bandidos.

“Deu medo, nunca imaginamos que isso iria acontecer, falamos que moramos no final do mundo, mas aconteceu, mudou toda nossa rotina, ainda estávamos seguros, os policiais estavam acampado aqui em frente então não tínhamos medo. Meu filho estava deitado na rede tomando tererê. Eu acompanhava o assalto pela rádio, eles passaram por São Paulo das Missões, localidade da Linha Sem Peixe, quando escutei barulho de carro muito rápido, então disse para ele cuidar que eram eles, não terminei de falar, começou o tiroteio aqui na frente, então corremos”.

Márcia nos relatou o dia que o criminoso foi morto próximo a sua casa, “escutávamos os gritos vindo lá de baixo, é um ser humano não é normal, nunca vivemos uma situação assim, não saíamos de casa, era proibido, porque poderia ocorrer tiroteio a qualquer momento, eram armas de grande alcance”.

PRESOS

O cerco seguiu na Linha 1º de Março, a Polícia Civil realiza o trabalho de investigação. “Estávamos realizando uma função atípica desde o confronto no banco, perseguição e cerco, mas foi muito importante participar disso. Como experiência profissional e para o sucesso da investigação, estar no local, coletando provas tanto no local do cerco e fora, tentando identificar quem eram os integrantes do grupo, conseguimos identificar alguns criminosos logo no inicio da investigação com base nas técnicas policiais investigativas. O primeiro preso foi em Porto Lucena, tentando comprar medicamentos, e auxiliou nas investigações indicando comparsas na cidade de Porto Xavier, nesse mesmo dia mais dois foram presos. Foi um trabalho muito integrado da Polícia Civil e Brigada Militar”, diz Delegado Heleno.

Após alguns dias um morador da localidade localizou o corpo de Alexandre Pacheco da Silva, 44 anos, já em estado de decomposição, junto com dinheiro e armas, “Foi um caso bem atípico, ele era portador de diabetes e bronquite e teve complicações, acabou morrendo no local do cerco, ele estava deitado com a cabeça na mochila com mais de R$ 100 mil reais e um fuzil ao lado”, relata o Delegado.

Luciano Aguilar de Mattos foi imobilizado por moradores, ele portava um revólver calibre 38, um carregador de fuzil 5.56 e munição, além de uma pequena quantia em dinheiro. Acionada, a BM enviou imediatamente o efetivo para o local e deteve o bandido, oriundo da Região Metropolitana de Porto Alegre. “Divulgamos fotos dos integrantes do grupo que ainda estavam sendo procurados, um foi preso por moradores saindo do cerco, 15 dias depois. Hoje seria mais difícil fazer isso, a polícia está impedida de divulgar fotos, mas foi graças a isso que conseguimos prender ele”, diz o Delegado.

MATA FECHADA

“A mata era muito densa o último criminoso que foi preso após o cerco nos confessou que tinha cavado na barranca do rio que se cobria com a vegetação, após averiguarmos no local consideramos que seria muito difícil avistá-lo mesmo passando próximo ao local”, relembra o Major Valtair.

“Foi à reportagem da minha vida”, diz Jota Flores

Um dos fatos marcantes que ajudou a polícia montar o cerco aos bandidos foi a transmissão da ação dos criminosos pela Rádio Navegantes AM 1360 KHz, que fica em cima do Banco do Brasil, alvo dos bandidos. A reportagem foi de Jota Flores, que conversou com a reportagem do Jornal Plural.

“Assim que cheguei à rádio escutei o primeiro disparo seguido por outros, a primeira reação foi ir para frente da rádio, a fachada é toda de vidro, quando cheguei avistei um dos assaltantes no meio da rua vestido com toca ninja, roupa camuflada e portando um fuzil, disparando para todo lado, pouco adiante tinha outro assaltante, então peguei o celular e liguei para a rádio, pedi a meus colegas para me colocar ao vivo que estava acompanhando um assalto em andamento, e fui colocado em ‘cadeia’ com mais rádios, abrangendo muitas cidades. O que eu tinha certeza é que ele não conseguia me enxergar (vidro escuro), em nenhum momento parei a transmissão, ficamos no ar até às 18h. Foram cenas de filme de terror, nunca tive a oportunidade de passar por isso, gostaria de passar de novo, foi a reportagem da minha vida, estou falando de coração, se houver oportunidade faço novamente é nossa função de profissionais do meio de comunicação passar para as pessoas o que está ocorrendo, em nenhum momento me passou pela cabeça que estava correndo perigo, só pensava em transmitir ao vivo, quem trabalha com comunicação sabe como é, passamos por cima de tudo. Quando eles saíram eu desci e comecei a entrevistar as pessoas que estavam no local e fui pedindo para as pessoas que avistavam o veículo dos bandidos ligassem para rádio e informassem. As pessoas começaram a ligar e passar informações ao vivo e eu comunicava a soldado da Brigada Militar que estava junto comigo, então ela passava para as viaturas a localização dos veículos, em minutos tinham dezenas de ligações dando informações, assim a polícia não perdeu o contato com os criminosos, o que ajudou bastante na perseguição e captura no cerco policial no mato”.

O repórter Jota Flores relatou sobre a experiência vivida, o que tirou de aprendizado, “O que fica de todo acontecido é a obrigação de um profissional da imprensa de poder ajudar da melhor maneira possível, depois que passou o fato fiquei algum tempo assustado, as pessoas me diziam que eu tinha estragado o assalto, que poderiam fazer algo comigo, então passei a mudar minha rotina, cuidar mais da minha família. Graças a Deus não aconteceu nada, espero que não aconteça, mas eu faria tudo de novo independente do que possa acontecer, passei noites dando entrevistas para outras rádios e televisão, tive meus 15 minutos de fama e ajudei a comunidade. Não tive um reconhecimento das autoridades, não trabalho pensando nisso, mas reconhecimento é sempre bom”.

R$ 1,1 MILHÃO

Segundo o documento da decisão judicial que confirmou a prisão de três dos quatro presos pelo assalto, os criminosos carregaram a levar a quantia de R$ 1,1 milhão do Banco do Brasil em suas mochilas. O valor recuperado não foi confirmado pelas autoridades, mas teria sido pelo menos a metade do que foi levado, já da outra metade, se supõe que os dois fugitivos do cerco tenham conseguido levar.

Sobre quanto foi gasto na operação o Major nos disse que não realizaram levantamento sobre os gastos, “Não fizemos esse levantamento, mas o custo deve ter sido maior que o valor roubado. Entendemos que a resposta que a comunidade precisa é se sentir segura, e que vamos dar resposta na busca da prisão, para que o mau elemento saiba que vindo aqui terá uma dificuldade maior, por que vamos buscar ele e entregar para justiça”.

“Era uma tortura com a tensão que vivemos”,diz Ervino Riske

Ervino Riske

Conversamos com o Ervino Riske, morador da localidade de 1º de Março, que localizou o corpo de Alexandre Pacheco da Silva, 44 anos, já em estado de decomposição, junto com dinheiro e armas. Alexandre era portador de diabetes e bronquite e teve complicações e acabou morrendo no local do cerco. A propriedade do agricultar fica praticamente junto ao mato onde os bandidos estavam escondidos.

O morador nos relatou que também estava acompanhando pelo rádio toda ação dos criminosos, “vi passarem aqui na rua em fuga, parecia um jato de tão rápido, logo na frente ocorreu a troca de tiros com os policiais, até um primo da minha esposa estava colhendo soja próximo e pensamos em colocar a máquina na frente, não teriam como cruzar, mas não deu um minuto, então eles cruzaram. Foram dias dramáticos, policia correndo para todos lados, mexeu muito com nosso psicológico e de toda vizinhança. A policia tentando nos proteger, mas era uma tortura com a tensão que vivemos, pensando que os bandidos poderiam chegar a qualquer momento e nos assaltar ou fazer de refém. Nunca passamos por isso, de noite era ainda pior, eu e minha esposa moramos pertinho do mato, foi uma situação bem complicada, já conseguimos superar tudo, mas foram dias tensos”.

Riske relatou como encontrou o corpo de Alexandre: “A policia foi embora e uma égua minha não estava aqui na propriedade, achei que tinha ocorrido algo então fui tratar os peixes, por que antes não tinha como descer até o lago, avisei minha esposa que iria atrás do animal, achava que ela deveria estar em algum lugar no potreiro, o meu cachorro foi na frente e farejando tinha um cheiro muito forte de podre, eu pensei que a égua estava morta, fui indo atrás do cachorro quando cheguei perto do mato e ele começou a me guiar até um local e avistei a égua parada, então olhei para o lado dela e vi o morto. Parecia que a égua estava vigiando o homem, estava do lado dele parecia que cuidando do corpo, ela pastava de noite e voltava a vigiar o corpo, não sei qual era o instinto dela, depois que tiraram o corpo ela voltou para casa”.

CORPO E DINHEIRO

Muitas pessoas se perguntam e comentam que teriam ficado com o dinheiro, era mais de 100 mil reais que estavam com o criminoso. Perguntamos qual foi a reação ao ver o corpo, armas e dinheiro, se não teve a tentação de pegar o dinheiro. Riske disse: “Notei que estava o fuzil dentro do estojo, cheguei mais perto, tinha uma sacola e pensei: não vou mexer ali, deixei que a policia viesse, dentro tinha o dinheiro e duas armas e muita munição. Penso duas vezes antes de fazer qualquer coisa, eu iria achar o morto, e cadê o dinheiro? Seus comparsas sabiam que ele estava com dinheiro, poderiam vir atrás de mim, me torturar, sequestrar alguém da família para eu ter que entregar o dinheiro, com essa atitude deixei que a policia levasse e fizesse seu serviço. Achei por bem essa atitude, para eu ficar de fora, deito e durmo tranquilo, não me preocupo que possam vir atrás de mim. Seus comparsas sabiam que ele estava com dinheiro, se eu passo a mão, iria me complicar”.

PONTO DE VISITAS

Dias após o ocorrido pessoas começaram ir ao local, devido a grande repercussão que o assalto teve.

Riske: “Não sabíamos quem eram pessoas andando por nossas terras, durante um mês, uns para conhecer o local, outros acredito que atrás de dinheiro, alguns dias depois da policia sair fomos para Santa Rosa, quando voltamos, na beira do rio, parecia que porcos tinham fuçado, não tinha uma moita que não havia sido revirada. Até agora encontramos dinheiro, notas de R$ 100 já desmanchando, quando encosta, ela se desmancha, foi muito dinheiro, ocorreu uma enchente dias depois, acredito que deve ter ido dinheiro até para o Rio Uruguai”.

MESES DEPOIS

Riske: “Agora estamos tranquilos, apenas pedimos para que isso não aconteça mais, não podemos pensar diferente, apenas perdemos com isso, não ganhamos nada, aqui todos perderam! Principalmente quem vendia leite, às vendas caíram, não podíamos levar as vacas no pasto, tenho açudes com peixes, não podia ir tratar eles, situação bem complicada”.

Quem são os envolvidos

Flávio Rogério Oliveira, 53 anos: Morador de Gravataí, região metropolitana, foi detido em uma praça em Porto Lucena. Ele foi até o município de ônibus, desceu na rodoviária e tentou comprar alimentos e remédios. Neste momento, a BM foi acionada. Aos policiais, segundo o delegado Santos, confessou informalmente participação no crime.

Delci Engers, 59 anos: Três dias após o assalto, no sábado (27/04/2019), foram capturados três suspeitos do crime, entre eles o policial militar aposentado. O sítio do sargento da reserva, segundo a Polícia Civil, teria sido usado para planejar o crime e também como esconderijo do bando antes do assalto ser cometido. Engers também teria sido responsável por fazer o levantamento nas proximidades do banco, antes do crime. Levado à Delegacia de Polícia, o militar se manteve em silêncio.

Ivo Zimmer, 57 anos: Foi preso na propriedade do policial militar da reserva, onde o grupo teria planejado o crime. Ele é apontado como um dos que teria prestado apoio logístico ao bando. A identificação dele, assim como do sargento aposentado, foi possível a partir da prisão de um primeiro suspeito.

Aleixo Gustavo Zelinski, 24 anos: O quarto preso negociou sua apresentação à polícia por meio de uma advogada e se entregou na segunda-feira (29/04/2019). Zelinski era conhecido da polícia e estava entre os suspeitos investigados, segundo a Polícia Civil. O delegado Heleno dos Santos afirmou que o preso colaborou com “informações impactantes” para a investigação.

Ezequiel Martim de Souza, 32 anos: No domingo (28/04/2019), houve novo confronto e o assaltante foi morto durante a troca de tiros com policiais. Souza teria tentado furar o cerco no fim da manhã. Com ele, foi apreendido um fuzil.

Luciano Aguilar de Mattos, 43 anos: Também é apontado como integrante do bando que assaltou a agência e foi preso na quarta-feira (08/05/2019). Lucianinho, como é conhecido, é natural de Porto Lucena, também na Região Noroeste, mas morava na Região Metropolitana.

Ezequiel David Trindade, 30 anos: Apontado como autor do disparo que matou o soldado da Brigada Militar havia escapado da prisão meses antes desse assalto, condenado a 32 anos de prisão por crimes como assalto e porte de arma, Trindade, que é natural de Erechim, na Região Norte, estava no regime semiaberto e é apontado como principal articulador de roubos a bancos em todo o estado, foi preso no dia 10 de junho pela Polícia Civil, na cidade de Vacaria.

MAIS ENVOLVIDOS

“Pouco a pouco fomos identificando e prendendo os envolvidos e quem deu apoio aos criminosos. Um morador de Porto Lucena foi preso, segundo as investigações ele manteve contato com os criminosos da região metropolitana, trazendo e deixando ficar em seu sitio durante aproximadamente 30 dias, enquanto faziam o planejamento para o assalto. Outras duas pessoas também foram presas por emprestar o sitio dias antes do crime. Algumas pessoas foram indiciadas porque parte do dinheiro se espalhou na zona do cerco e algumas pessoas ficaram com os valores que encontravam, tentaram inclusive nos ludibriar depositando em contas de terceiros para depois chegar a suas contas. Usaram até pessoas jurídicas para realizar essas transferências, foram descobertos e indiciados. Além dos seis bandidos, outras seis pessoas foram presas envolvidas no caso”, diz Delegado Heleno

OPERAÇÃO

Segundo o Delegado Heleno: “No ponto de vista investigativo, a operação foi um sucesso, o ponto negativo foi à morte do soldado Fabiano. Um trabalho em conjunto da Brigada Militar e Polícia Civil com apoio de vários órgãos de segurança, foi um aprendizado para a Polícia, mudou a forma das policias encararem os roubos a banco. Até então tínhamos roubos seguidamente, depois desse fato, aqui praticamente se escasseou no noticiário policial roubo a banco com cordão humano. Nosso caso serviu de motivação para a polícia, no sentido que mostramos que vale a pena ir para o combate, atuar de forma forte enérgica como foi feito e utilizar os meios investigativos.”

Sobre o dinheiro encontrado o Major Valtair disse, “encontramos uma grande quantidade de dinheiro no veículo que foi abandonado na mata e no encontro do cadáver que morreu por causas naturais, esse elemento também estava muito bem escondido em uma vegetação baixa, dinheiro solto foi encontrado muito pouco por equipes do BOPE que realizaram incursões na mata e encontraram, mas outras quantidades foram encontradas depois quando saímos do cerco por pessoas”.

“Durante todos dias eram encontrados vestígios que eles estavam na mata, movimentação tentativa de fuga que ocorreram duas vezes, luvas, resto de alimento pois eles tinham na mochila levado alimento em caso de fuga onde já deveriam ter previsto essa fuga na mata, nos três últimos dias foram a movimentação foi diminuindo até no decimo dia ter zerado qualquer movimento na mata então decidimos encerrar o cerco”.

O Major relatou que a BM se aprimorou ainda mais para esse tipo de ocorrências, “a Brigada Militar depois dessa ocorrência fez uma reformulação e participamos desse estudo para que em novos casos as ações, protocolos e atitudes fossem tomadas em base no que vivenciamos. Tivemos uma ocorrência triste a morte do soldado Fabiano, devemos tirar lições do que fizemos de correto e no que poderíamos ter melhorado para que esse fato trágico não venha se repetir. Ocorrências dessa natureza diminuíram e nas que tiveram já houve êxito maior”.

ENVOLVIDOS SOLTOS

No mês de outubro de 2019, a Justiça revogou a prisão preventiva de três indivíduos acusados de participação no assalto à agência do Banco do Brasil. A decisão foi da juíza Priscila Anadon Carvalho, da Comarca de Porto Xavier. Ezequiel David Trindade, Delci Engers e Ivo Zimmer tiveram a prisão revogada.

A magistrada considerou ‘frágil’ o reconhecimento de testemunhas, que foi feito por meio de fotografias, no caso de Ezequiel.

Além disso, os indícios de prova da denúncia que ligavam Delci e Ivo ao fato, também foi considerado frágil, pela juíza. “As testemunhas até então ouvidas em Juízo, entre elas diversos policiais, foram uníssonas em afirmar que o único indício existente acerca da participação de ambos seria um depoimento informal prestado por Flávio [um dos presos que seria da quadrilha] por ocasião da sua prisão”, afirma ela na decisão.

Por fim, a juíza determinou medidas cautelares em substituição à prisão preventiva dos três, como proibição de se ausentar da Comarca de Porto Xavier ou mudar de endereço sem comunicar o Juízo; comparecimento mensal em juízo, para informar e justificar atividades.

Devido a outros processos, Ezequiel David Trindade continua preso. Outros indivíduos que teriam participado do ataque, seguem presos.

“Particularmente não me abato em razão disso, compreendo o sistema de justiça criminal, eu sei meu papel, que é investigar e prender, depois o que seguir não é comigo, não me deixo abater, posso ficar chateado, mas desistir jamais”, finaliza Delegado Heleno.

COMUNIDADE

A comunidade regional além de auxiliar a policia durante a fuga dos assaltantes e repassando informações, também foi fundamental para os longos dias do cerco.

“A comunidade colaborou muito, cedendo alimentos, com doações em: Porto Lucena, Porto Xavier, Santa Rosa, São Luz Gonzaga e outras cidades da região. Montamos na escola, uma cozinha que não parava dia a dia, foram dias de sol, chuva, frio. A participação da comunidade foi muito importante, inclusive durante a perseguição. Durante o assalto, uma rádio de Porto Xavier noticiou os fatos ao vivo, os policiais que estavam comigo conseguiram acompanhar pelo WhatsApp as informações da rádio onde moradores informavam onde o veículo dos bandidos estava passando e isso nos ajudou muito até chegarmos na localidade onde ocorreu o cerco”, finaliza o Delegado Heleno.

“A participação da comunidade foi essencial desde o momento do roubo prestando informações através da rádio em um local que é de difícil comunicação nos auxiliou muito para centralização das comunicações e a pronta resposta da Brigada Militar. As instituições da segurança pública foram acolhidas na região nos dando suporte que não tínhamos no primeiro momento, a comunidade da Linha 1º de Março, nos forneceu a sede para instalação da cozinha, alojamento e refeitório. Para manter 150 policiais trabalhando 24 horas nesse local é preciso uma logística muito grande, ACISAP e FENASOJA e demais entidades foram um start no voluntariado levando alimentação, água potável, montando uma logística de um restaurante para alimentar 150 pessoas, com café, almoço, janta e lanche da madrugada, a comunidade através das entidades de classe, cidadãos que nos ligavam manifestando interesse em participar ajudando de alguma forma, então eles montavam grupos de trabalho na parte da cozinha, tivemos que selecionar as pessoas eram muitos voluntários. A comunidade foi essencial em todos os sentidos”, finaliza o Major Valtair.

 

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